O Crime do Padre Amaro | Resenha

by - dezembro 06, 2018

Foto: Cecília Justen

Ei! Tudo bem?
Espero que sim :)

Hoje, mais um clássico, mas infelizmente o último do ano. E nada melhor do que terminar com a amargura de Eça de Queirós pela Igreja Católica. O autor, que viveu em Portugal em um período em que a religião influenciava a vida de todos, via a ciência como uma grande solução, por isso vem O Crime do Padre Amaro, para chocar a sociedade e mostrar que o catolicismo da época era extremamente incoerente.

Abrindo o Realismo, sim uma das matérias de Literatura, Eça abandona todo o lado do Romantismo para nos mostrar o óbvio, o claro, não deixar brechas para idealizações e criticar toda a realidade. Ficou curioso? Vem comigo, mas venha preparado.

O Crime do Padre Amaro - Eça de Queirós

Sinopse: O autor adota um ponto de vista desapaixonado para narrar a história da infeliz Amélia, seduzida pelo inescrupuloso Amaro, que entra para o convento graças à imposição de uma nobre beata. Sem vocação alguma, o padre aceita o seu destino passivamente, mostrando absoluto desinteresse pela profissão que abraça sem entusiasmo, e termina pecando contra a castidade, traindo os votos proferidos na sua ordenação. Amélia, educada em um ambiente fervorosamente católico, acostuma-se a viver em um meio hipócrita. Sua atração pelo padre, pura paixão carnal que a desorienta e destrói, nasce da falta de referências morais e do desconhecimento completo do que seja o amor. Os burgueses, os aristocratas, os políticos, os sacerdotes são os vários componentes de um sistema social decadente e perverso. Os seres humanos não são indivíduos propriamente, mas temperamentos dominados pelo instinto e pelo meio social, que lhes determinam o modo de agir.


Páginas: 496 | Autor(a): Eça de Queirós | Editora: Ciranda Cultural | Gênero: Romance 


Amaro é o mais jovem padre que parara na pequena cidade de Leiria, um lugar pacato e que sofre extrema influência de seus cidadãos devotos, o diferente - como o ateísmo - não é aceito pela sociedade. Entretanto, o homem recém chegado não tem vocação alguma para padre, na verdade, toda a sua vida não passara de séries de infelizes eventos que o fizeram parar até ali. Sua madrinha, uma marquesa importante, o colocou dentro do seminário, e com tios extremamente agressores, o pequeno Amaro de 13 anos não viu a hora de entrar na escola que o livraria de todo seu sofrimento. Ele passara a aceitar sua situação e, assim, a ser influenciado por todos em seu meio.

Ao se mudar para Leiria, ele se hospeda na casa da S. Joaneira, que tem uma bela filha, Amélia. A atração do padre pela jovem se torna inevitável e incontrolável, principalmente quando ambos percebem que o desejo não afeta apenas um, mas os dois. Assim, observando todos em sua volta, todos os pecados dos cidadãos, a pureza e inocência de Amélia e sabendo que seu mestre do seminário tem um caso com a S. Joaneira, Amaro não pensa duas vezes e é tomado pela paixão carnal que sente, passando a fazer de tudo para ter o corpo da jovem cristã.

E é com todo o seu lado devoto que Amaro faz com que Amélia não sinta que sua relação é pecado, na verdade, é usando a religião que ele promete um futuro de santidade para os dois. O romance carnal cresce até que graves eventos vão aparecer em suas vidas, tornando Amaro um homem possessivo, Amélia uma mulher abandonada e o relacionamento deles o fim de suas vidas.

"Ao outro dia, na cidade, falava-se da chegada do pároco novo, e todos sabiam já que tinha trazido um baú de lata, que era magro e alto, e que chamava padre-mestre ao cónego Dias. As amigas da S. Joaneira, − as íntimas – a D. Maria da Assunção, as Gansosos, tinham ido logo pela manhã a casa dela para se porem ao facto... Eram nove horas; Amaro saíra com o cónego. A S. Joaneira, radiosa, importante, recebeu-as no alto da escada, de mangas arregaçadas, nos arranjos da manhã; e imediatamente, com animação, contou a chegada do pároco, as suas boas maneiras, o que tinha dito..."

A última resenha que eu fiz para o blog eu disse que o livro seria uma obra para poucos, O Crime do Padre Amaro entra no mesmo caso. Apesar de não ser uma história proibida (já foi em um passado não tão distante assim), muitos religiosos podem se sentir incomodados e até mesmo quem é ateu pode ver a crueldade dos personagens e querer largar o romance.

Essa não é uma história comum, porque você quer que o casal consiga ficar junto e tenham um relacionamento real, mas com o passar das páginas você percebe que Amaro é um homem cruel e que usa da inocência de Amélia para conseguir o que ele quiser, e em boa parte do tempo é sexo. Sua crueldade ganha mais força quando ele decide santificar a jovem e a obrigar a persistir na relação.

Amaro, no início, convence qualquer leitor com seu passado infeliz. Em nenhum momento ele se sentiu na vocação de entrar no seminário, mas sua vida era tão degradante e triste que ser padre em um futuro próximo parecia o melhor acontecimento de sua vida. Entretanto, em todas as páginas é palpável sua infelicidade, principalmente quando conhece Amélia e sua maior vontade é se casar com a jovem para que ambos sejam felizes. Isso, infelizmente, não acontece. E é assim que ele se transforma em um verdadeiro monstro, tomando para si raiva e descontando no sofrimento de Amélia.

Mulheres conseguem entender a situação melhor do que homens, mas ambos, com mínimo de conhecimento, percebem que há uma história por detrás da imagem da mulher, e é isso que acontece nesse livro. Todo mundo lê sabendo que quem sairá machucada de fato será Amélia, e não Amaro. O próprio protagonista sabe disso, pois é usando do patriarcado que muitas chantagens são feitas em cima da mocinha. Então como mulher, a história se torna muito mais dolorosa.

"Nunca suspeitara um tal escândalo! A S. Joaneira, a pachorrenta S. Joaneira! O cónego, seu mestre de Moral! E era um velho, sem os ímpetos do sangue novo, já na paz que lhe deveriam ter dado a idade, a nutrição, as dignidades eclesiásticas! Que faria então um homem novo e forte, que sente uma vida abundante no fundo das suas veias reclamar e arder!"

Eu posso fazer vários comentários contra o horror e terror que é O Crime do Padre Amaro (que não é apenas ser padre, ele irá cometer crimes reais), mas em nenhum momento posso falar alguma coisa sobre a genialidade de Eça de Queirós. É um livro difícil de engolir, porém, é porque não é apenas uma ficção. O autor conduz a história com maldade, com sangue escorrendo dos olhos, com raiva e muito sarcasmo. Você entra na imaginação dele e começa a tomar seus sentimentos, querendo um fim digno para cada personagem.

Falando sobre final, ele é muito histórico, pois se passa na época da Comuna de Paris e mostra as influências que o evento teve em Portugal. As últimas frases vão te levar a querer rasgar todas as páginas e tacar fogo na história, mas não poderia ser incrivelmente pior. Eça termina a história do mesmo jeito que começa, cruelmente. Então não posso escrever que seu trabalho não fora concluído genialmente.

"– Escutem, criaturas de Deus! Eu não quero dizer que a confissão seja uma brincadeira! Irra! Eu não sou pedreiro-livre! O que eu quero dizer é que é um meio de persuasão, de saber o que se passa, de dirigir o rebanho para aqui ou para ali... E quando é para o serviço de Deus, é uma arma. Aí está o que é – a absolvição é uma arma!"

Como eu disse anteriormente, mas precisarei repetir, essa não é uma obra fácil de aceitar e, por isso, alguns poderiam dar nenhuma nota, assim como poderiam dar o máximo possível. Não acho que fique nos extremos, pois apesar de todos os meus pontos positivos, é uma leitura muito difícil, mas não pelo vocabulário já morto, mas sim pelas descrições desnecessárias e, em alguns momentos, entediantes do autor, pois eram repetitivas.

Todavia, não posso tirar o crédito de Eça por fazer e mostrar para o mundo a realidade que muitos não tiveram a coragem de fazer.

"Mirou-se um momento, naquela seda azul-celeste que a envolvia toda, picada do brilho agudo das estrelas, com uma magnificência sideral. Sentia-lhe o peso rico. A santidade que o manto adquirira no contacto com os ombros da imagem penetrava-a duma voluptuosidade beata. Um fluido mais doce que o ar da terra envolvia-a, fazia-lhe passar no corpo a carícia do éter do Paraíso. Parecia-lhe ser uma santa no andor, ou mais alto, no Céu...
Amaro babava-se para ela:
– Oh filhinha, és mais linda que Nossa Senhora!"

Nota: 4/5 ♥ 

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Um beijo e paz no coraçãozinho de vocês! ✩

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