Menino de Ouro| Resenha

by - setembro 28, 2019

Foto: Vai Lendo

Ei!

Tudo bem?

Já comentei inúmeras vezes aqui com vocês sobre o papel social que a literatura possui. Através de suas histórias, os autores podem explorar temáticas que muitas vezes não são tão comuns assim e, assim ser capaz de desmistificar alguns conceitos que repetimos erroneamente. Sabemos muito bem como a sociedade julga e castiga aqueles que pensam, se comportam ou "são" diferentes dos padrões e eu amo quando pego um livro que foge exatamente desses conceitos já conhecidos e expõem outras perspectivas e pontos de vista. Estou falando disso pois a obra que escolhi trazer aqui pra vocês hoje é Menino de Ouro, da autora Abigail Thomas e lançado aqui no Brasil pela editora Globo Alt que se propõe em discutir a intersexualidade (hermafroditismo) na adolescência.



Autor(a): Abigail Thomas
Editora: Globo Alt
Gênero: Ficção, YA, Drama
Nùmero de Páginas: 384
Sinopse: A família de Max não permitiria nenhum desvio na imagem perfeita que havia construído. Karen, a mãe, é uma advogada renomada, determinada a manter a fachada de boa mãe, esposa e profissional. Steve, o pai, é o exemplo do chefe de família presente em sua comunidade, favorito a um importante cargo público. O ponto fora da curva é Daniel, o caçula, que, para os padrões da família Walker, é “estranho”: não é carinhoso, inteligente ou perfeito como Max. Melhor aluno da escola, capitão do time de futebol, atlético, simpático, sucesso entre as garotas: Max, o primogênito, é o menino de ouro. Ninguém poderia dizer que sua vida não é perfeitamente normal. Ninguém poderia dizer que Max esconde um segredo. Ele é diferente, especial. Max é intersexual: nasceu com os dois conjuntos de cromossomos, XX e XY e, portanto, é menino e menina. Ou nenhum dos dois. É a partir do olhar de cada pessoa que orbita a vida de Max que a autora Abigail Tarttelin compõe a sua narrativa em Menino de Ouro. Cada uma das personagens esboça seu dia a dia, suas inseguranças e conquistas, e, principalmente, seu relacionamento com Max. Apesar da dimensão de seu segredo, Max parece à vontade com sua vida. Seus questionamentos sobre sexo, relacionamentos e até sobre rejeição são tantos quanto um adolescente de 15 anos poderia ter. O cenário muda drasticamente quando Hunter, seu melhor amigo desde a infância, volta do passado e abusa de sua confiança da pior maneira que poderia. Max se vê forçado a explorar seu segredo radicalmente, e percebe que muito mais foi escondido desde o seu nascimento. Por que sua família nunca conversou sobre suas opções? Quais eram elas? Como seria seu futuro? Como os outros lidariam com ele agora: seus amigos, seus parentes... Sua namorada? Quem é Max, realmente?



Max é um menino de 16 anos que se encaixa perfeitamente ao título do livro e é totalmente padrãozinho: Menino de Ouro. Possui uma boa criação, estudou em boas escolas, possui amplo acesso a tecnologia, é educado, gentil, carinhoso, inteligente, popular na escola e crush de quase todas as meninas de sua turma. Seus pais possuem uma boa condição financeira; sua mãe trabalha como advogada e seu pai, político. Eles vivem uma casa grande e confortável junto com o irmão de Max, Daniel que possui 10 anos. Em suma, eles são a representação de uma família de comercial de margarina: Sem defeitos. No entanto, Max nasceu com uma rara condição genética em que ele possui ambos os órgãos reprodutores masculino e feminino, além de ambos os pares de cromossomos, XX e XY. Em outras palavras, Max é intersexual (também conhecido como hermafrodita). Tal condição é o grande segredo da família que opta por manter a condição em segredo por medo da reação das pessoas, principalmente devido ao preconceito. Após um evento traumático e devastador, Max é obrigado a confrontar seus pais e entender tudo sobre sua condição, além de precisar lidar com as consequência de tal evento e se descobrir.

Mas, para ser honesto, nunca pensei de fato sobre isso. Só tenho sido o Max.

Eu sei que a sinopse que eu fiz não conta muito sobre a história, mas realmente é necessário manter um "mistério" com relação aos eventos para que vocês possam sorver ao máximo dessa leitura incrível. Max sempre se sentiu confortável com sua condição e enxergava as coisas com normalidade, ainda que seus pais não revelassem por completo todos os detalhes sobre a sua condição, no entanto, o personagem passa por uma jornada de descobrimento, aceitação e, acima de tudo, em busca da verdade sobre quem de fato é. Mesmo não podendo dar mais detalhes, uma coisa é necessário avisar vocês desde já:  O início do livro é brutal e devastador. Tal evento ocorre logo nas primeiras páginas  e é algo repulsivo. Algumas pessoas podem estranhar ou se incomodarem com o teor da narrativa, pois a autora escreve de maneira explícita e interminável. Eu digo isso pois eu realmente me incomodei e cogitei em largar a leitura, no entanto, é algo totalmente pertinente e que basicamente servirá como apoio para a construção de toda a história de Menino de Ouro. Continuem que vão se surpreender. Eu, particularmente, não possuía nenhuma informação a respeito sobre intersexualismo e a obra foi uma grata surpresa. O livro é uma verdadeira aula sobre a temática em que são compartilhadas inúmeras lições sobre a condição, sexualidade, e diversas coisas que sequer eu poderia imaginar que estariam envolvidas. Pude perceber que o assunto é muito mais complexo do que parece e envolvem outras questões, principalmente sobre o lado psicológico do portador dessa condição. A adolescência já é uma etapa da vida altamente complicada e complexa, geralmente possuímos muito medo de rejeição e solidão e, muitas vezes optamos por "passar despercebidos" e não chamar atenção, imaginem na situação do Max ter que lidar com isso tudo e ainda com o fato de não entender quem ele de fato é?

Você precisa de coragem para fazer qualquer coisa. A mesma coragem que precisa ter para fazer um teste ou fazer escolhas ou escrever um poema quando o último que fez ficou uma merda, é a mesma coisa que sair à noite sem ficar apavorado. Se tiver medo, você nunca vai viver. Você precisa de coragem pra viver.

Menino de Ouro é um livro muito informativo e deixo aqui os meus parabéns para a autora. Não faço ideia de como ela adquiriu todos esses conhecimentos, mas é perceptível a propriedade com que a mesma escreve e narra as inúmeras situações vividas por Max. Talvez nesse ponto você pode estar pensando que a obra é algo maçante e científico, mas é uma leitura fluída e que se adapta ao público; Através dos personagens, a autora conversa com o leitor e desperta um forte sentimento de empatia: É impossível não se conectar com todo o drama do adolescente e chega ser extremamente sufocante ver o quão perdido ele se encontra com relação a sua própria vida. O livro é muito dinâmico e a história é narrada a partir de diversos personagens e suas perspectivas sobre a história. Particularmente, gosto muito quando os autores fazem uso dessa técnica pois acredito que dessa forma, se consegue trabalhar melhor a conexão e inserção dos personagens na trama e também entender melhor um pouquinho o que cada um deles pensa a respeito do assunto, o que facilita ainda mais a construção desse sentimento empático que comentei agora pouco. É uma leitura que coloca o dedo na ferida e expõe diversas falhas em nossa sociedade atual (eu infelizmente não posso comentar muito sobre para não entregar detalhes), mas acreditem em mim: É um livro doloroso, cruel e extremamente real. O melhor de tudo é que Abigail escreve de uma maneira tão prazerosa de ler e os personagens possuem um senso de humor coerente com a história criada que acaba se tornando algo "menos difícil" de se ler. Em momento algum fiquei entediado ou achei que a abordagem médica e científica tenha sido exagerada ou muito difícil para que pessoas leigas no assuntos (assim como eu) não conseguissem entender; muito pelo contrário.

Quando eu era pequeno, os médicos me chamaram de hermafrodita. Essa palavra tem muito estigma, mas como palavra, por si só, prefiro essa. É uma coisa. Não é algo entre duas coisas.

A minha única reclamação com o livro (e que de fato não me incomodou tanto, é apenas um detalhe) é que achei Max um tanto quanto "reativo" com relação ao seu diagnóstico. A adolescência é uma fase de descobertas e de muita curiosidade, e mesmo que ele estivesse tranquilo com relação a sua condição e tratasse com normalidade (o que de fato é), me irritava um pouco o fato dele não querer buscar mais informações a respeito. O livro se passa nos anos atuais e o mesmo possui computador, celular, internet. É impossível que a única fonte para obter mais detalhes eram seus pais e ele fica uma boa parte da história se fazendo alguns questionamentos em que as respostas estavam ao alcance dos seus dedos. Acredito que a autora tenha optado por fazer dessa forma para que a história avançasse em seu ritmo próprio, mas hoje em dia é quase impossível se viver sem o Google do lado.

Estou começando a entender que tentar ser perfeito foi o objetivo da minha vida. Da nossa vida. Tentar ser essa pessoa sorridente e sem defeitos, nessa família amorosa e feliz que se encaixa perfeitamente nessa cidadezinha bonita e inofensiva. 

Como citei, encontrei apenas um único problema no livro, mas que não atrapalha de maneira nenhuma o andamento da história. Menino de Ouro é um dos melhores livros que li no mês passado - e estejam preparados para vê-lo na lista do final do ano - em que pude aprender muitas coisas sobre um tema em que praticamente todos desconhecem. É um livro altamente emocionante, educativo, informativo e que ao mesmo tempo é prazeroso e indicado para todas as idades. Acredito que seria uma ótima indicação para a utilização em clubes de leituras, debates sobre sexualidade e outras questões. Vale a pena demais! Como disse lá no início, Max faz jus ao título da obra, mas sem sobra de dúvidas, Abigail Thomas também é uma Autora de Ouro.


Nota: 5,0/5,0


Espero que tenham gostado da resenha de hoje e lembrem-se: Não se esqueçam de deixar seu comentário e compartilhar o texto com aquele seu amigo leitor. Nos vemos próximo sábado. Até lá!





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