Afinal, cor tem gênero?

by - março 01, 2019

Foto: Google

Olá, pessoas, tudo bem com vocês?

Hoje temos o primeiro texto que irá integrar um novo quadro aqui no site chamado de Chá das Seis. A Cecis fez um post explicando todos os detalhes sobre como irá funcionar e caso você queria ler, basta clicar aqui

Pensei diversos dias a respeito de qual seria o tema para esse primeiro texto. Depois de muito bater a cabeça, me lembrei de uma situação que ocorreram alguns meses atrás e resolvi falar um pouquinho para vocês. Estamos vivendo em um período altamente tecnológico. Tá, qual a novidade aí, Gabriel? A internet revolucionou a forma com que as notícias são compartilhadas. Diariamente somos bombardeados com centenas de notícias, declarações e informações e basta apenas que uma vírgula seja colocada em um lugar errado (às vezes até uma ausência de vírgula pode ser o estopim) que o caos está instaurado nas redes sociais. Em segundos pipocam centenas de milhares de comentários a respeito, uns a favor, outros contra. Alguns com argumentos bem pertinentes e válidos e outros cuja única intenção é colocar a lenha na fogueira. Fazem quase 3 meses que o novo governo assumiu e, para os amantes de debates políticos, o que não falta é tema para se discutir. Um dos mais recentes (e mais polêmicos) foi dito por uma ministra que afirmava que meninos deveriam vestir azul e meninas rosa. O objetivo desse texto não é criticar ou apoiar a fala da ministra; isso, em minha opinião, só contribuiria ainda mais para a polarização política em que o país se encontra. Tampouco sou cientista político e deixo as análises de competência para quem de fato estudou para tal. Apenas gostaria de destacar essa frase e perguntar para vocês:


Afinal, cor tem gênero?


Antes de chegarmos até a discussão na qual esse texto se baseia, vamos fazer uma viagem no tempo, mais precisamente em meados da década de 20, período em que os pigmentos utilizados para colorir as roupas eram caríssimos! Sim, apenas uma parcela bem privilegiada da população possuía condições de ostentarem roupas que fugissem das tonalidades de branco e bege. Como resultado todas as crianças - meninos e meninas - utilizavam apenas uma cor, a branca e não havia nenhuma distinção entre os sexos. Outro fato curioso é que todas as crianças até uma determinada idade utilizassem vestidos (brancos). A explicação era apenas uma: Conforto e comodidade na hora de realizar a higiene dos pequenos. Anos depois a peça passou a ser associada exclusivamente para o o público feminino e iremos debater isso mais adiante. Com o passar dos anos, os pigmentos já eram encontrados em um preço mais acessível e logo as lojas e mercados começaram a investir em peças com cores chamativas, quebrando a hegemonia da cor branca. Então foi nessa época que se determinou que meninos usariam azul e meninas rosa? Errado. Acreditem ou não, mas o rosa, por ser  uma tonalidade mais forte e escura começou a ser associada ao sexo masculino enquanto o azul, mais suave e delicado começou a ser utilizado para as meninas. Percebam que apesar da inversão de cores, a imposição entre gênero e cor é a mesma dos dias de hoje.


O motivo:


Marketing. Alguns anos após, por volta da década de 40, de acordo com estudos realizados na época, se determinou que o rosa fosse utilizado para as meninas por conta de sua suavidade e leveza. As lojas, por sua vez, modificaram suas vitrines e passaram a exibir tons de azul em peças masculinas e rosa em roupas masculinas. A ideia ao pouco foi se disseminando de que havia uma cor "mais adequada" para um determinado sexo e os pais, com medo de que as outras pessoas confundissem seus filhos com o sexo oposto por conta da cor utilizada, começaram a trocar os enxovais. Bem louco, né? Não preciso nem comentar que fiquei muito curioso para entender como e porquê isso acontece. Acessei inúmeros sites, li pesquisas, artigos e tudo que falasse a respeito do tema e encontrei um único ponto que serve como denominador comum para explicar essa associação forçada entre algum produto específico e o gênero da pessoa: Lucro. Nos estudos da época, ficou claro que todas as vezes que uma determinada peça ou artigo ficava "encalhado" nas prateleiras das lojas, se iniciava uma massiva campanha em que associava tal item a um determinado público alvo. Aos poucos a ideia de que azul era cor de menino e rosa era de menina foi adquirindo peso e ganhando popularidade entre a população. Dessa mesma forma ficou determinado que meninas usariam vestidos e meninos, calça. Anos depois, já com os primeiros movimentos feministas e a luta das mulheres em prol de direitos e igualdade, esse tabu foi desmistificado e as mulheres passaram a usar calças sem "comprometer" sua feminilidade. Analisando tudo que foi dito até aqui, percebem que há um padrão que sempre se repete? Não interessa qual seja o produto, existe sempre uma delimitação de quem pode ou não usufruir do mesmo; o motivo, por sua vez, também se repete: Maximização de lucros e aumento de vendas. 


Nos dias atuais....

Muita coisa mudou desde a década de 20. Já evoluímos muito no quesito igualdade entre os gêneros. Percebam que utilizei a palavra evolução, que dá a ideia de movimento contínuo, pois sei que ainda há um loooongo caminho a ser seguido para atingir o objetivo principal. Esse tipo de discussão está cada vez mais presente em escolas, universidades, grupinhos de amigos e afins. Infelizmente, frases como a dita pela ministra (mesmo que retirada de contexto e possam não expressar sua opinião real a respeito do assunto) me preocupam muito, pois há uma grande parcela da população que continua replicando os mesmos comportamentos de décadas atrás sem ao menos criticarem a informação e entenderem por conta própria. Independente de classe, gênero, orientação sexual, cada um pode usar a cor que quiser, usar a roupa que quiser, brincar com o que quiser e isso não interfere em nada em seu ser singular. É impossível falar sobre essa polêmica das cores sem cair nos debates a respeito de identidade de gênero ou orientação sexual e dizer que brincar de boneca é coisa de menina e que um menino tem que brincar de carrinho é o mesmo que dizer que meninas devem comer arroz, e meninos feijão. Posso ter sido um pouco extremista na utilização dessa metáfora, mas percebem o quão absurdo é essa segregação? Usar uma calça comprida não te faz menos mulher e usar rosa não me faz menos homem. Cor, orientação sexual e identidade de gênero NÃO POSSUEM NADA EM COMUM. E que isso fique claro de uma vez por todas. Uma cor não determina quem eu sou ou quem eu amo. Um brinquedo não irá influenciar uma criança a um gênero diferente do seu. Uma roupa não te transforma em homem ou mulher. Meu filho pode brincar de boneca e usar rosa, azul, lilás. Sua filha pode jogar bola e usar preto, branco, amarelo e verde. Não faz o menor sentido achar que uma coisa tão irrelevante como uma cor ou uma brincadeira sejam agentes tão decisivos em coisas que nós não temos a menor escolha sobre. Somos do jeito que somos independente da cor que usamos, dos livros que lemos, dos filmes que assistimos, dos amigos que temos ou da faculdade que frequentamos. Nascemos da forma que somos e não vai ser uma cor que vai me influenciar a seguir por outro caminho. Escuto muitos dizerem que precisamos proteger nossas crianças dessa libertinagem que vivemos nos dias de hoje. Quanto mais eu leio sobre, mais eu vejo que as pessoas perpetuam seus preconceitos e comportamentos arcaicos atrás de uma falsa fala de proteção.

Foto: Marcos Gallão


Como disse, meu objetivo com o texto não era discutir política ou sociologia. Tudo que escrevi apenas representa a minha opinião e peço desculpas caso você não concorde com algum dos meus argumentos. Não pretendo ofender a forma com quem vocês pensam e tampouco doutrinar vocês: Somos seres livres que pensamos da forma que quisermos. O que proponho com esse texto é que façamos uma reflexão sobre coisas que muitas vezes repetimos sem nem ao menos entender o que estamos falando. Seja rosa, azul, branco, verde ou amarelo, somos todos humanos. 

Espero que vocês tenham gostado do texto, peço desculpas se me estendi mais do que deveria. Lembrando que podem sempre deixar seu comentário com dúvidas, críticas, elogios ou sugestões, todos serão sempre lidos e respondidos. Caso vocês também queiram sugerir algum tema para ser abordado aqui no Chá das Seis, fiquem à vontade. Semana que vem tem texto da Cecis aqui pro quadro, mas eu volto em breve.

Até lá! :)


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